Com 2 metros de altura aos 14 anos, gêmeos do interior de SP vivem rotina desafiadora após diagnóstico de síndrome rara
21/06/2025
(Foto: Reprodução) Roberto e Victor são de Valinhos (SP) e foram diagnosticados aos 8 anos. A condição rara faz com que os gêmeos tenham um crescimento fora do comum para a idade e fragilidades nos ligamentos do corpo. Com 2 metros de altura aos 14 anos, gêmeos enfrentam dificuldades com síndrome rara
Quando o sinal do recreio toca, é hora de organizar a fila para voltar à sala de aula. Os irmãos gêmeos Roberto e Victor Marinangelo já têm o lugar marcado: direto para o final. Não por escolha, mas por uma regra comum nas escolas -- os maiores ficam atrás.
Aos 14 anos, os dois medem 2,02 metros de altura. O crescimento fora do comum para idade acontece devido a um diagnóstico médico raro, a síndrome de Loeys-Dietz, pouco conhecida, até mesmo pela medicina.
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A condição genética afeta todo o corpo, incluindo pele, visão, coração, sistema circulatório e ligamentos que, por serem mais frouxos, impedem os gêmeos de praticarem atividades físicas de impacto, como andar de bicicleta e jogar bola, comuns entre meninos dessa idade.
No entanto, as dificuldades vão além das brincadeiras. A técnica de enfermagem Tatiane Ferreira conta que os filhos enfrentam transtornos para usar o transporte, não encontram vestimentas e têm desconforto com as carteiras da escola, que não são adaptadas para o tamanho deles.
Tatiane Ferreira tem 1,75 metros de altura e os filhos gêmeos, de 14 anos, medem 2,02 metros.
Estevão Mamédio/g1
"O Victor, por exemplo, não usa sapato, nenhum tipo de sapato, porque o pé dele é muito torto para dentro, devido a síndrome e ao crescimento. Faz dois anos que ele só usa chinelo para tudo, no frio, para ir para uma festa, para igreja...", relatou Tatiane.
Ela afirma que os dois já passaram por diversas cirurgias desde o nascimento e pontua que o diagnóstico demorou anos para ser fechado. O g1 conversou com a família, que mora em Valinhos (SP), e ouviu um geneticista para entender mais detalhes sobre a síndrome.
O que é a síndrome Loeys-Dietz e como é feito o diagnóstico
O médico geneticista da Unicamp Ruy Sobrinho explica que a síndrome de Loeys-Dietz foi identificada em 2005 e, por isso, durante muito tempo, pacientes com a condição tiveram o diagnóstico de Síndrome de Marfan, que tem sintomas parecidos. Foi o que aconteceu com Roberto e Victor.
Os meninos tinham 8 anos quando receberam o diagnóstico correto, em 2019. Os médicos perceberem diferenças ao comparar pacientes das duas síndromes e, por meio de um exame de sequenciamento genético, detectaram a mutação em nove genes dos adolescentes.
As principais diferenças entre as síndromes, segundo Ruy, são:
a úvula, campainha da garganta, que é alargada, duplicada ou partida em pacientes com Loeys-Dietz;
a dilatação dos vasos sanguíneos, que na Síndrome de Marfan ocorre apenas na aorta ascendente.
"Com o tempo notou-se também que alguns desses pacientes tinham as articulações mais frouxas, a pele mais frágil e translúcida, a coluna do pescoço mais instável, podendo levar a compressão da medula e vários tipos de alergias e problemas intestinais".
O geneticista explica também que e o tratamento padrão para o problema circulatório visto na síndrome de Marfan não tinha resultados tão bons em pessoas com Loeys-Dietz, o que contribuiu para a descoberta da condição dos meninos.
A síndrome de Loeys-Dietz impõem dificuldades na rotina dos gêmeos, como tomar banho com a altura do chuveiro.
Estevão Mamédio/g1
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Quando entraram na escola, os gêmeos tinham dificuldades com a coordenação motora fina, mas passaram por fisioterapias e tiveram melhora. Atualmente, a maior adversidade tem sido o tamanho das cadeiras e as perguntas dos colegas de sala sobre a altura dos adolescentes.
"Em qualquer tipo de carteira, tanto no intervalo, quanto na sala, machuca o joelho, aí fica marcado, dói. Na escola, o pessoal acha esquisito fica perguntando quantos metros a gente tem, o porquê que tem, o que a gente tem. E normalmente quando a gente passa no corredor, todo mundo fica encarando por causa da altura", contou Roberto.
Tratamento inclui injeções de testosterona e cirurgias
Injeções de testosterona semanais têm feito parte do tratamento feito pelos meninos. A expectativa é que o hormônio ajude com a chegada da puberdade, que está atrasada, e desacelere o crescimento incomum. "Sem as injeções de testosterona, o médico me disse que eles podem chegar a 2,20 metros de altura", disse Tatiane.
Victor, que já realizou sete cirurgias, precisou passar por um procedimento que salvou sua vida em 2020. Por conta da síndrome, os meninos também têm o sistema cardiológico afetado e possuem uma válvula no coração, que pode dilatar conforme o crescimento e causar aneurismas que podem estourar.
"O Victor já fez a reposição de válvula dele e o Roberto ainda acompanha com a cardiologista, porque a dele ainda está dilatando aos poucos, está estável, mas uma hora vai precisar também fazer a cirurgia", explica a mãe dos gêmeos.
Os gêmeos Roberto e Victor Marinangelo tiveram o diagnóstico fechado aos 8 anos de idade.
Estevão Mamédio/g1
O médico Ruy Sobrinho esclarece que esse é o principal risco que pacientes com a doença possuem. Por isso, é essencial que seja feita a monitoração adequada, com exames anuais, que irão verificar o aumento do tamanho da artéria aorta na saída do coração.
Dificuldades se estendem a família
Cuidado é a palavra que rege Tatiane nas 24 horas de seu dia. Roberto e Victor precisam evitar tombos para não romper ligamentos e devem monitorar qualquer tipo de sintoma incomum. A mãe está sempre de olhos atentos.
Ela precisou deixar o emprego formal para dar atenção total aos filhos. Hoje tenta receber ajuda do Governo Federal dos quais tem direito, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a pessoas com deficiência, mas relata que teve um dos pedidos negados. Atualmente, apenas Victor recebe o benefício.
O g1 pediu uma posição ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), responsável pelo benefício, mas a pasta informou que, por conta da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) não comenta casos específicos.
"Às vezes eu pareço ser forte o tempo todo, estou sempre rindo, brincando, mas tenho os meus dias que eu também choro, que eu fico deprimida, que eu abraço eles e choro", desabafa.
Tatiane também precisou se mudar do apartamento em que morava para uma casa onde os meninos tivessem mais conforto. "Eu vou cuidar deles até o fim. Eles são meu suporte do dia a dia, é onde eu me escoro pra me manter em pé. São os dois", diz.
O transporte também é difícil, o joelho de Roberto e Victor costumam ficar machucados por conta do espaço para as pernas.
Estevão Mamédio/g1
*Estagiárias sob supervisão de Yasmin Castro.
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